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A crise na engenharia de projetos

Há um mês escrevi resumidamente em um post nas minhas redes sociais a respeito da crise na engenharia de projetos, tema que gostaria de abordar de forma mais aprofundada neste artigo. Observa-se que a qualidade dos projetos tem diminuído ao longo dos anos, mesmo com a evolução tecnológica que possibilita o detalhamento computadorizado de projetos a partir da “revolução CAD”, na década de 1990.

Com base na experiência pessoal que trago nesses mais de 10 anos como engenheiro de estruturas, atuando entre escritórios de projetos e engenharia corporativa, elenco alguns problemas observados, como a dificuldade das empresas em contratar bons profissionais pelos baixos salários ou honorários oferecidos, o foco excessivo em quantidade (desenhos) e não em qualidade (soluções), e o gerenciamento e fiscalização ineficazes.

Os baixos salários oferecidos a engenheiros de projetos são um problema a ser atacado em grandes empresas. É comum a contratação de profissionais como analistas, por exemplo, para evitar a fiscalização do Conselho Regional, já que o salário oferecido não atinge o piso estabelecido. É óbvio que se deve levar em conta os altos custos de encargos trabalhistas vigentes no Brasil, que são valores adicionais ao salário pagos tanto ao funcionário, quanto ao governo e outras entidades sociais e que tornam muitas vezes a contratação inviável, principalmente a novas ou pequenas empresas. Não estou pretendendo tirar o incentivo à contratação de profissionais desta forma, porém empresas iniciantes e de menor porte não têm capacidade de arcar com tantos custos como aquelas grandes e consolidadas. Usando-me como exemplo, quando concluí a graduação aceitei trabalhar como associado a um escritório de projetos estruturais, onde já estagiava há 1 ano, recebendo 20% do valor de cada contrato fechado. Esta foi uma experiência muito boa, tanto no sentido profissional, permitindo que pudesse aprender a profissão com um engenheiro experiente e competente, quanto no pessoal, visto que a flexibilidade desta modalidade de contratação me deu a oportunidade de concluir o mestrado. A possibilidade de direcionar o recurso financeiro da empresa diretamente ao profissional pode estimular a contratação com melhores salários, valorizando e incentivando engenheiros na carreira.

O foco na quantidade de projetos entregues em detrimento da qualidade é, na minha opinião, o principal resultado da desvalorização da engenharia como profissão. Contratos fechados a baixos valores, com projetos feitos por profissionais sem compromisso com o resultado, e com clientes interessados apenas no menor custo formam um ciclo perigoso, que pode levar a uma perda de confiança da sociedade em relação à engenharia. Está cada vez mais comum na internet, sobretudo em redes sociais, vídeos que mostram muros de contenção, lajes e estruturas de cobertura que colapsam devido a erros de projeto, e, ao analisar esses projetos, nota-se a falta de cuidado com a consideração de variáveis básicas e detalhamentos executivos. Parte disso está ligado à inexperiência do profissional, parte à automatização computacional dos projetos (ver meu artigo “A engenharia de projetos e a cultura de 'operar softwares'”) e parte ao problema central do tópico: entregar, entregar e entregar.

Em paralelo com este tema, falo sobre gerenciamento e fiscalização ineficazes de projetos, problema observado sobretudo em grandes empresas e principalmente empresas públicas. Estes são fatores críticos que podem levar a atrasos, custos excessivos e, em casos extremos, falhas estruturais com consequências graves. A falta de planejamento detalhado, a má alocação de recursos, a ausência de monitoramento contínuo e a insuficiência de comunicação entre as partes envolvidas são problemas comuns que comprometem a qualidade e a segurança dos projetos. Além disso, a fiscalização inadequada por parte dos órgãos responsáveis pode permitir o descumprimento de normas técnicas e legais, aumentando os riscos de irregularidades e acidentes. Para evitar esses cenários, é essencial adotar práticas de gestão robustas, com definição clara de metas, prazos e responsabilidades, além de investir em profissionais qualificados (e bem remunerados), assegurando que os padrões técnicos e de segurança sejam rigorosamente seguidos. Além disso, é fundamental garantir uma supervisão rigorosa em todas as etapas do projeto e execução, com inspeções periódicas, auditorias independentes e a aplicação de penalidades em caso de descumprimento das normas. A transparência e a comunicação eficiente entre todos os envolvidos – projetistas, executores e cliente – também são pilares para o sucesso, minimizando riscos e garantindo a entrega de projetos dentro do prazo, custo e qualidade esperados.

Esses problemas que, na minha opinião, são a base da crise da engenharia de projetos não são fáceis de se contornar. A principal mudança necessária seria uma transformação na mentalidade do cliente final. Este, seja pessoa física, empresa pública ou privada, deve valorizar técnica e financeiramente os projetos de engenharia, enxergando-os não como custo, mas como investimento em uma obra segura, durável e adequada ao seu propósito.

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